A responsabilização civil decorrente de acidente de trabalho permanece como um dos temas mais sensíveis e recorrentes na Justiça do Trabalho. A controvérsia se intensifica quando a atividade exercida pelo empregado é classificada como de risco, deslocando o eixo da discussão da culpa subjetiva para a responsabilidade objetiva do empregador, nos termos do artigo 927, parágrafo único, do Código Civil. Nesse contexto, ganha especial relevância o dever constitucional e legal de fundamentação das decisões judiciais, sobretudo diante da fixação de indenizações por danos morais, estéticos e materiais.
Pontos-chave
- Atividade de gari coletor reconhecida como atividade de risco
- Aplicação da responsabilidade objetiva do empregador em acidentes de trabalho
- Discussão sobre fundamentação genérica da sentença à luz do artigo 489, §1º, do CPC
- Alegação de culpa exclusiva da vítima como excludente do nexo causal
- Critérios legais para fixação das indenizações por danos extrapatrimoniais
- Pensão vitalícia fixada sem redução comprovada da capacidade laboral
Contextualização jurídica
O acidente de trabalho, nos termos do artigo 7º, XXVIII, da Constituição Federal, pode gerar o dever de indenizar quando demonstrado o nexo causal entre o dano e a atividade laboral. Tradicionalmente, a responsabilização exigia a comprovação de culpa do empregador. Contudo, com a consolidação da jurisprudência trabalhista e civil, passou-se a admitir a responsabilidade objetiva quando a atividade normalmente desenvolvida implicar risco acentuado ao trabalhador.
O artigo 927, parágrafo único, do Código Civil estabelece que haverá obrigação de reparar o dano independentemente de culpa quando a atividade, por sua natureza, expuser terceiros a riscos. Na Justiça do Trabalho, tal dispositivo é amplamente aplicado a funções como a de gari coletor, em razão da exposição habitual a agentes físicos, biológicos e mecânicos.
Paralelamente, o Código de Processo Civil, em seu artigo 489, §1º, impõe ao julgador o dever de apresentar fundamentação concreta, específica e vinculada ao caso, vedando decisões baseadas em expressões genéricas ou abstratas.
Desenvolvimento técnico
Responsabilidade objetiva em atividades de risco
A caracterização da atividade como de risco afasta a necessidade de comprovação de culpa do empregador. Nessa hipótese, basta a demonstração:
- do dano
- do nexo causal entre o dano e a atividade exercida
A discussão desloca-se, então, para a existência de excludentes de responsabilidade, como o caso fortuito externo, força maior ou a culpa exclusiva da vítima.
Culpa exclusiva da vítima como excludente
Ainda que se reconheça a responsabilidade objetiva, a jurisprudência admite o afastamento do dever de indenizar quando comprovado que o acidente decorreu exclusivamente de conduta do trabalhador, sem qualquer contribuição do empregador.
Entre os elementos relevantes para essa análise, destacam-se:
- entrega regular de EPIs
- fiscalização do uso dos equipamentos
- realização periódica de treinamentos obrigatórios
- conduta voluntária do empregado em desacordo com as normas de segurança
Quando tais circunstâncias estão devidamente comprovadas nos autos, a culpa exclusiva rompe o nexo causal.
Fundamentação da sentença e artigo 489 do CPC
A ausência de fundamentação específica compromete a validade da decisão. Expressões como “atividade de risco elevado” ou “falha de vigilância” exigem correlação direta com os fatos concretos do processo.
Fundamentar não é apenas decidir, mas demonstrar:
- em que consiste o risco
- como a conduta empresarial contribuiu para o acidente
- de que forma os elementos probatórios conduzem à conclusão adotada
Decisões genéricas violam o contraditório substancial e dificultam o controle recursal.
Fixação das indenizações e artigo 223-G da CLT
A Consolidação das Leis do Trabalho determina que a indenização por dano extrapatrimonial deve observar:
- a natureza da lesão
- a intensidade do sofrimento
- a possibilidade de superação
- os reflexos pessoais e sociais
- a extensão do dano
A fixação de valores sem análise individualizada desses critérios revela fragilidade na motivação da sentença.
Ponto sensível do caso: a fixação de pensão em parcela única sem que o laudo pericial tenha reconhecido redução da capacidade laborativa do reclamante, o que contraria o princípio de que a indenização deve ser medida pela extensão do dano efetivamente comprovado.
Análise crítica fundamentada
Aspecto crítico do caso:
A adoção da responsabilidade objetiva não dispensa o julgador do dever de examinar com rigor as provas relativas à conduta empresarial e às excludentes do nexo causal.
Risco processual relevante:
A fixação de indenizações sem fundamentação específica pode gerar distorções patrimoniais relevantes, sobretudo quando envolve pensão vitalícia sem incapacidade comprovada.
Ponto de atenção:
O reconhecimento automático do risco da atividade não pode converter-se em presunção absoluta de responsabilidade, sob pena de esvaziar a análise probatória e a segurança jurídica.
Conclusão
Nos casos de acidente de trabalho envolvendo atividade de risco, a aplicação da responsabilidade objetiva é juridicamente admissível e amplamente acolhida pela jurisprudência. Contudo, isso não exonera o Poder Judiciário do dever de fundamentação concreta e individualizada, nem afasta a análise de excludentes como a culpa exclusiva da vítima.
A efetividade da tutela jurisdicional exige equilíbrio entre a proteção à saúde do trabalhador e a observância rigorosa dos critérios legais de responsabilização e quantificação do dano.
Perguntas frequentes
Atividade de risco sempre gera responsabilidade objetiva?
Em regra, sim, quando a atividade expõe o trabalhador a riscos acima do ordinário, nos termos do artigo 927, parágrafo único, do Código Civil.
A culpa exclusiva do empregado pode afastar a indenização?
Pode, desde que fique comprovado que o acidente decorreu exclusivamente de conduta do trabalhador, rompendo o nexo causal.
É obrigatória a fundamentação detalhada da sentença?
Sim. O artigo 489, §1º, do CPC exige fundamentação específica, vedando decisões genéricas.
A empresa é responsável mesmo entregando EPIs?
A entrega e fiscalização de EPIs não afastam automaticamente a responsabilidade objetiva, mas são relevantes para a análise de excludentes.
Pode haver pensão sem incapacidade laboral?
A pensão pressupõe demonstração de perda ou redução da capacidade de trabalho, devidamente comprovada por prova técnica.
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